sábado, 5 de fevereiro de 2011

Existindo na memória

Trilhei muitos caminhos até encontrar este vasto planalto. Nunca antes tinha visto além do horizonte que se organizava sobre o mar. Na sua beira aprendi a silenciar, mesmo quando o coração trabalha acelerado. Perto do mar aprendi a perceber as correntes que passam em silêncio perto dos recifes de coral.
Em muitas tardes, parei para ouvir as ondas dançando, encontrei em cada movimento um pouco de mim. Um pouco dessa mulher que antes se amedrontava com tudo. Uma mulher insone que teimou, muitas vezes e por horas em dissecar sua vida e seus problemas, na madrugada e só percebia que tudo se tornava mais claro com a luz do sol.
Passei por ruas estreitas, e vi nas pedras da calçada filmes em flash de momentos que ficaram perdidos no tempo. Sei que falar assim pode parecer sem sentido para muitos, mas no portal que ora me encontro, a memória trabalha por saltos, se entrega ao devaneio com uma rapidez surpreendente.
Divago entre o hoje e o ontem com quem atravessa uma ponte. Vou da mulher à criança em segundos. Ora me vejo brincando com minhas tranças, ora me emociono com os versos que ainda recordo do poeta que lia quando era adolescente. Muitas horas me detive em contemplar a descrição dos cedros do Líbano e chegava mesmo, a sentir o cheiro do seu perfume. Vivi toda a poesia das palavras e senti com intensidade cada palavra que se movimentava nas páginas dos livros.
Por muito tempo achei que o mundo me entrava pelos poros quando mergulhava numa narrativa ficcional. Viajei para espaços distantes e lá permaneci por muito tempo. Creio até que parte de mim não retornou até hoje.
Sinto no presente falta da poesia que exalava de tudo, do meu olhar que vislumbrava cada detalhe das coisas como se as visse pela primeira vez. Quero novamente saber mergulhar na floresta do alheamento que Pessoa tantas vezes me levou pela mão. Eu fui e com ele senti o cheiro perfumado do tabaco e o gosto amargo do chocolate.
Preciso novamente me abrir para o deslumbramento, a procura do não sei que da arte que nos faz capazes de viver a verdadeira catarse de existir.


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