sábado, 26 de fevereiro de 2011

Tantos rostos

Sempre que me encontro no meio de tantos rostos e a música está presente, saio do meio deles e vou para um lugar onde só eu habito, eu e meu coração calado. Vou para o espaço do indizível, porque se digo, me entrego e me enfraqueço.
Os anos passam e a saudade do futuro é enorme. Saudade do que é vindouro, diria mesmo, saudade de ultrapassar os umbrais do tempo. Atirar-me para além daqui e do agora.
Sei que a busca é a minha tônica, sei que a busca é o meu destino, sei que a busca me trouxe até aqui e me atira para a frente.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Voltando pela estrada

Sempre me sinto em paz quando pego o volante do carro e tomo o rumo de casa. Mergulho no som que toca no rádio. Vejo as luzes passado, vejo a memória se manifestando. Hoje me vi saindo do lugar em mergulhar na fantasia. Vi janelas acesas, pessoas andando em suas casas e com elas me integrei, senti suas histórias e ouvi suas vozes.
Me sinto sempre só, como quem procura a música perfeita, o sentimento profundo, os cabelos voando, a pele morna da vida que pulsa em mim.
Hoje mergulho nos olhos, nos silêncios das pessoas que me cercam e me encontro um pouco em cada uma delas.

domingo, 20 de fevereiro de 2011

Bahia: meu lugar no mundo

Toda depressão cava fundo o buraco do nosso peito, cavuca nossa alma e pergunta: onde está o nó? Onde está a resposta?
Sinto que as depressões que afundaram meu peito, apontavam todas para uma direção, a do sufocamento. Escondendo a minha baianidade intensa, o meu jeito de ser eu. Desde que o planalto se tornou minha casa, tentei apagar das minhas entranhas a minha casa original. Uma tentativa insana de sobreviver ao ar seco e à distância do mar, o mar que me trazia e me levava em cada arrebentação do medo.
Meus olhos seguiam o caminho do mar, lá eu abria meu peito e expulsava a dor de nunca saber quem eu era. No mar eu expurgava o amargor das minhas incertezas adolescentes. Com os olhos no mar eu tentava entender porque o silêncio me atordoava, porque as ruas cheias de gente e de cheiros pareciam estar desertas.
Eu sempre me guiei pelo mar, pelo bater das ondas e pouco me importava não ter raízes, porque a saudade que se delineava para além do horizonte me sufocava. Mas eu estava na minha Bahia. Quando a dor apertava eu comia acarajé e caminhava pelo corredor da Vitória. Cruzava os olhos com o transeunte anônimo e no mel dos seus olhos eu construía uma história de amor, sem palavras, mas com o coração palpitando.
Eu sabia muito pouco do mundo e muito pouco de mim, mas sabia do barulho do mar, sabia do vento que fazia a areia subir e arder os olhos.
Por muito tempo eu tentei me tornar alguém sem minhas pulseiras, meus brincos e meu batom cor de uva. Tive filhos, busquei amores e nada encontrei além do silêncio do cerrado.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Lendo cartas

As cartas sempre me fascinaram. Desde as cartas de amor até as cartas do tarô. Vejo nelas sempre o jogo, a sedução. Nelas há coisas ditas, mas há coisas escondidas. Palavras que vem e vão criando novos movimentos, abrindo novos caminhos, tecendo certezas.
Sempre vivi descartando e organizando as jogadas,com isso, já me senti fora do baralho.
As epístolas tem seu encanto. São organizadas para dizer verdades e construir mentiras. Falam de amor e separação, falam de despedidas, falam de morte e de vida.
Atrás de cada carta há uma chama de uma vela, um olhar que se projeta para alcançar a palavra certa. Aquela que descreverá o que se sente, ou quem sabe ocultar o que não queremos que saibam.
Já escrevi cartas, orações, memórias. Entretanto, são as cartas de despedida que me fascinam. Prometem tanto, mas o coração está cheio de dor. As cartas de despedida são lenços brancos que se perdem na curva do caminho. As carruagens somem, mas o perfume do vinho, do tabaco e o gosto do último beijo permanecem. Balzac sabia como ninguém falar de despedidas.Pessoa falava de perdas como quem nada ganhou e eu quero penetrar no feitiço das cartas dos mais diversos autores, Quero que minhas mãos digitem as mais longas cartas para falar da vida, da minha intermitência e do mundo que me povoa.
Quero ser uma guardiã que consola os aflitos e protege os fracos, porque o meu voar será cada vez mais para dentro, até que eu e o mergulho sejamos uma e a mesma coisa.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Textualizando

Hoje dirigi meu carro como quem toma as rédeas de um cavalo jovem. Tive a certeza que a estrada que tomei hoje foi trilhada pela primeira vez.  Sou mulher, mãe, forte, frágil e principalmente consciente dos meus limites.
Sei pouco da vida, mas sei mais de mim. As curvas do corpo se tornam menos sinuosas, mas o espírito está mais firme. Amanhã visitarei um Santuário e lá deixarei um agradecimento sincero à energia criadora que se move em mim e em tudo que nos cerca.
Cheguei até aqui construindo cada pedaço da minha história com linhas pouco firmes, outras horas usei cordões grossos. Sempre soube pouco de como foi feito o risco do meu bordado.
Sei que sou uma cuidadora, vim com essa característica. Tenho necessidade de afagar as pessoas, de envolvê-las e escutar seus silêncios.  Quando hajo assim, consigo ver com mais nitidez as pedras sobre as quais preciso pisar.
Trago em meu seio uma ânsia de ver para além das veredas ou ruas estreitas. Quero muito ler o mundo com os olhos da poesia, daquela poesia que consegue transformar o nada em enlevo.
Estou retomando aos poucos o contato com o texto, o texto que me escreve, o texto que me constrói como narrativa. Eu começo a contar de mim para poder mais cedo ou mais tarde tecer novos textos que contem de outros que brotam diante dos meus olhos e que ainda não sei narrar. Escrevo para conseguir um dia ficcionalizar. Não sei dizer se é cedo ou tarde, mas sei que havia a necessidade de dar os primeiros passos e como criança estou amaciando o chão, estirando o papel para me fazer palavra. 

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Parceria comigo mesma

Hoje fiquei de molho na cama. Passei o dia me recuperando de um excesso alimentar. Excesso que não foi diferente de tantos outros que já tive nos últimos anos. Na verdade, os excessos emocionais são as causas primeiras. São os impasses, as situações não resolvidas e que muitas vezes dependem de mim também, que me levam a engolir aquilo que quero expulsar de mim.
Sou hoje alguém que quer viver intensamente, o corpo dá seus limites. Meu coração não quer viver batendo devagar, como diz a música. Sei que não sou mais jovem, mas meu sentir o mundo continua adolescendo, enfrentando os tsunamis, buscando as tempestades. Não sei me sentir viva de outra forma.
Hoje vivo trancada numa cadeia sem chaves, a porta fica aberta, mas ainda não fortaleci as asas o suficiente para me jogar e alçar o céu.
Tenho certeza que é uma questão de tempo, de me preparar devagar para a liberdade. Meus rebentos já estão viçosos, meus pais já caminhando em direção ao entardecer e quero trilhar meu caminho daqui para a frente sem amarras conjugais, sem senões ou porquês. Quero parcerias de jornada, nada que impeça que a parceria seja a mesma em todas as incursões, mas quero projetar cada jornada, cada detalhe com uma viagem única.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

Existindo na memória

Trilhei muitos caminhos até encontrar este vasto planalto. Nunca antes tinha visto além do horizonte que se organizava sobre o mar. Na sua beira aprendi a silenciar, mesmo quando o coração trabalha acelerado. Perto do mar aprendi a perceber as correntes que passam em silêncio perto dos recifes de coral.
Em muitas tardes, parei para ouvir as ondas dançando, encontrei em cada movimento um pouco de mim. Um pouco dessa mulher que antes se amedrontava com tudo. Uma mulher insone que teimou, muitas vezes e por horas em dissecar sua vida e seus problemas, na madrugada e só percebia que tudo se tornava mais claro com a luz do sol.
Passei por ruas estreitas, e vi nas pedras da calçada filmes em flash de momentos que ficaram perdidos no tempo. Sei que falar assim pode parecer sem sentido para muitos, mas no portal que ora me encontro, a memória trabalha por saltos, se entrega ao devaneio com uma rapidez surpreendente.
Divago entre o hoje e o ontem com quem atravessa uma ponte. Vou da mulher à criança em segundos. Ora me vejo brincando com minhas tranças, ora me emociono com os versos que ainda recordo do poeta que lia quando era adolescente. Muitas horas me detive em contemplar a descrição dos cedros do Líbano e chegava mesmo, a sentir o cheiro do seu perfume. Vivi toda a poesia das palavras e senti com intensidade cada palavra que se movimentava nas páginas dos livros.
Por muito tempo achei que o mundo me entrava pelos poros quando mergulhava numa narrativa ficcional. Viajei para espaços distantes e lá permaneci por muito tempo. Creio até que parte de mim não retornou até hoje.
Sinto no presente falta da poesia que exalava de tudo, do meu olhar que vislumbrava cada detalhe das coisas como se as visse pela primeira vez. Quero novamente saber mergulhar na floresta do alheamento que Pessoa tantas vezes me levou pela mão. Eu fui e com ele senti o cheiro perfumado do tabaco e o gosto amargo do chocolate.
Preciso novamente me abrir para o deslumbramento, a procura do não sei que da arte que nos faz capazes de viver a verdadeira catarse de existir.