quinta-feira, 18 de julho de 2013

Cartografando minha palavra.

Hoje sentada em minha mesa no trabalho, vislumbrando uma tarde cinza que insiste em cair, ouvi Paulo Freire sussurrando em meus ouvidos que eu devia fechar minhas portas e não deixar mais que o opressor se aloje em mim. Fiz isso de alojar quem me oprime por uns bons 40 anos. Em mim habitavam todas as vozes que diziam o que era certo e o que era errado. Desde ao meu modo de ser até como eu fazia as coisas. Eram vozes fortes, intensas, que muitas vezes me amordaçavam mesmo quando eu estava sozinha. A mordaça era grande, a sensação de estrangulamento intensa e nada me fortalecia o bastante para resistir ou lutar contra cada uma delas. Precisei morrer por dentro, adoecer como um todo com a dor dessa pressão para poder destrancar as portas de mim e expulsá-las todas, ou quase todas. Talvez ainda uma resida aqui, me fazendo chorar e alimentar o medo que algumas vezes me faz retroceder ou calar. Como li em um fragmento de um texto: "Paulo Freire já não está entre nós, ou melhor, está em todos nós da rede que teceu... o pensamento, a práxis, enfim o legado de Paulo Freire, não pertence a uma pessoa ou a uma instituição. Pertence a quem precisa dele, e ele tinha consciência de que o que havia escrito pertencia àqueles por quem lutava: os oprimidos." A cada postagem que faço estou exercitando a dizer a minha palavra, me dizer um pouco. Hoje estou com vontade de chorar, uma pressão no peito, porque vi na fala de outra mulher as vozes opressores se manifestando, e ela as incorporando como dela. Preocupando com o que os outros vão dizer se a virem fazendo isso ou aquilo. Uma atitude que já tive muitas vezes, mas que aprendi e estou aprendendo a identificar para não deixar a porta aberta ou escancarada para os opressores que nos rondam todos os dias. Esta tarefa de superação exige esforço e dedicação quase diuturnas. Em cada frase que formulo ou cada posição que assumo diante do mundo estão eivadas, em potência, da dor causada pela opressão. Há na sociedade a opressão sobre os menos favorecidos, há uma luta de classes instaurada e perene. Há em nós, em cada um de nós uma luta interna para superar os discursos que nos formaram e deformaram e sairmos em busca da palavra que nos diz. Precisamos construir um discurso nosso, que tenha o meu cheiro e a minha marca. Freud tanto nos ensinou que somos impregnados de marcas que adquirimos ao longo da vida, mas se faz necessário que desenvolvamos a capacidade de identificar essas marcas e desenharmos nosso próprio mapa. Nossa cartografia, aquela do meu desejo, a que Delleuze tão bem definiu como a atitude de cartografar: desmanchar mundos e dar vida a novos mundos. Assim vivo eu, desfazendo meus mundos interiores e construindo novos mundos que muitas vezes pulam para fora de mim.